segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

-Velho, eu não quero escrever como se psicografasse. Como vou explicar aos meus amigos que até me respeitam que converso com um fantasma! -Para de reclamar e anota o que vou falar. Eu quero participar deste momento. Tenho direito. -Um fantasma marxista-leninista falando comigo? Isso é o cúmulo da incoerência. E o materialismo, velho? -Mas você não pode contar pra ninguém que sou eu. Vou ficar desmoralizado. -E como é que você pensa que me sinto? Também sou materialista, lembra? -Escreve aí, depois a gente combina alguma coisa. Morri em 76. Cai nesta situação constrangedora porque fico aqui vendo o mundo passar, somente contigo consigo conversar e vejo a história escorrendo pelos dedos destes vivos que não aproveitam o tempo que lhes resta. Não posso me omitir. Anote. Quero falar sobre o "Mensalão". Tenho que deixar minha opinião. -Tu estás morto, cara! Tens que cair na real. Quem vai se interessar pela opinião de um membro do Partido Comunista que morreu em 76? -Anota. Deixa de ser chata! Você sabe que por muito tempo fui o responsável pelo dinheiro que o Partido recebia da Rússia. Sabe que eu recebia maletas de dólares e que jamais usei um tostão para mim. Você lembra da miséria que vivi naquele horrível período em que o Partido ficou sem se comunicar comigo. Quase todos foram morar no leste europeu e eu fiquei aqui, na miséria, lembra? Não guardei um tostão nem para as emergências que vivíamos na clandestinidade. De repente os contatos desapareceram e aí nós passamos fome. Não consegui sobreviver muito tempo. Desespero, fome, medo de que me encontrassem, que fizessem algum mal à minha família. Não importa. Eu quero registrar minha perplexidade com o que vejo agora no Brasil. Assisti a este processo que chama de "Mensalão" ao teu lado. São tantos lados, tudo misturado. Fico enojado com estes desgraçados que usam o serviço público para roubar. Aí vem o PT que criou esta estrutura frágil e louca, com uma certeza dos loucos de que nunca seriam descobertos. Um projeto de poder. A classe operária chegou ao poder. E se espelham nos padrões dos patrões? Se sentiram acima do bem e do mal. Acredito que alguns não usaram o dinheiro para fins pessoais. Quer saber? Não acredito nesta pose de Maquiavel. Achar que se pode posar de Robin Wood num mundo tão complexo? E quem pode provar que neste projeto de poder só há a pureza de Dom Quixote? -Velho, meu sono chegou. Boa noite. -Continua a mesma pequeno-burguesa de merda. -Vai catar alguma comunista pra te traduzir e me deixa dormir.

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